quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Pedro e Daniel


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Enfim, uma janela … após onze períodos, uma pausa para pensar em que me incomodava, sem interferências. Dirigi-me à sala de descanso. Café, cadeira confortável ao centro da mesa, pernas para o alto, pensamentos altamente erotizados. Foi quando um colega entrou bruscamente, resmungando trivialidades do ofício. Sentou-se atrevidamente em uma poltrona no extremo da sala. Pensamentos distantes rapidamente voltaram ao ambiente a mirar maliciosamente o colega. Figura despojada, à vontade, sem pudor algum. Era um homem belo, robusto, grandes olhos acompanhados de lábios acentuadamente delineados, personalidade marcante, forte com pequenos traços brutos. “Ah, se ele me jogasse naquela parede ...”. É, se ele jogasse ... Levantei-me para servir mais um café. “Café?”, perguntei. “Por favor”, disse em meio a um riso irônico, “adoro que me sirvam”, completou. Caracas, que filho da pqp... Servi-o, com prazer, e voltei a minha posição inicial. 

Passado alguns minutos, eis que entra um outro colega. “Janela”, pronunciou aliviado. Este, diferentemente do outro, era um tipo normal, óculos, silhueta sem estilos, porém essencialmente maduro, convencional e portador de ricos pensamentos, oferecia aprendizado constante. “Ah, se destilasse poesias ao pé do meu ouvido.” “Café?”, novamente perguntei, “Claro, se você me acompanhar, mas permita que eu sirva”, respondeu. “Opostos, Pedro e Daniel* personificados”, pensei convicta … Trouxe-me o café e dirigiu-se à outra ponta da mesa.

Os dois liam compulsivamente e eu, pensava sem interrupções ... “Melhor ser jogada na parede do que ouvir poesias ...”, uma voz soprou de leve ao meu ouvido. “Que nada, satisfaça-se por completo … embebeda-se de conteúdo”, uma segunda voz, exaltadamente. “Entorpeça-se de líquido quente, isto sim ...”, novamente a primeira.

Sensações de calor, acompanhadas de calafrios, consumiam o meu equilíbrio. “Louca”, disse a mim mesma na intenção de obter alívio .
Percebendo o meu desconforto, “Calor aqui, não? Abrimos uma das janelas?”, disse o segundo colega quase que melodicamente. Nada pronunciei e assim ele o fez. “Mais um café? Agora eu te sirvo”, disse o primeiro com um sorriso safado no canto da boca, “Valha-me, Deus”, pensei quase que como uma prece ...

“Louca, devassa, embebeda-se, entorpeça-se, líquido e conteúdo, fusão perfeita, equilíbrio, satisfação, êxtase e tesão … pegue os dois!” , uma terceira voz em sussurros gostosamente pronunciados ... “Pegue-os, faça deles vinho e pão, acalanto e rebento”. Era essa a minha opção ...

Em busca de ar, tentando equilibrar um corpo obtuso, levantei-me, bruscamente, (desabotoando os primeiros botões da blusa como quem se liberta das amarras da razão... queria insanidade, volúpia e satisfação) e dirigi-me ao centro da sala sob olhares surpresos. Decidida e preparada para a aquisição da minha satisfação, eis que pronuncio involuntariamente: “rapazes, voltemos ao trabalho … faltam dois minutos para o início do último período”. Sem olhá-los, agarrei meu material com forças de um corpo nulo de saciedade, e caminhei em direção à porta permitindo interferências, novamente, em meus pensamentos ...

* referência ao romance As Pupilas do Senhor Reitor, Júlio Dinis

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